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  • Foto do escritorMiguel Fernández

Cowboy Fora da Lei

Era 2023 e eu estava visitando outro estado, a trabalho, quando encontrei uns colegas que discutiam a cassação do diploma e a exclusão do CREA de um colega que se chamava, creio, Honório, Engenheiro Florestal (EF). Esses colegas formavam o conselho de ética daquele CREA.


Como quase sempre, e em quase tudo, havia um grupo contra e outro a favor.  Havia até um, o Manolo, que além de não considerar o engenheiro-réu culpado, invocava o espírito cristão dos demais para perdoar os pecadores, mesmo que errado. Aliás, o tal do Manolo achava que o colega nem estava errado. Iria votar a favor do nosso curupira-boitatá e defendê-lo.


Aos poucos, ouvindo, fui entendendo o que estava havendo com o desventurado colega e a linha de argumentação do tal Manolo.


Não, o curupira não tinha cometido erros profissionais, as árvores que plantara vicejavam, dentro da programação, nenhum êrro na identificação das espécies, as dosagens de fertilizantes e defensivos perfeita, tanto nos viveiros quanto no campo, o manuseio (corte / plantio) dentro dos conformes, os clientes estavam satisfeitos, tudo corria bem.  Até que houve uma denúncia contra êle: teria falsificado um documento de um órgão ambiental liberando uma compensação ambiental que havia sido feita dentro das regras técnicas e das regras legais.  Alguns colegas, ansiosos por mostrarem seu poder e como consertar o mundo, queriam puni-lo exemplarmente pela falsificação.


Os que tomaram as dores do “florestal”, argumentavam que o Conselho Profissional deveria se ater a julgar coisas técnicas. Falsificar um documento de um órgão ambiental era um problema policial, nada a ver com a profissão. Conhecendo a burocracia desses órgãos, podia até ser um atenuante argumentava o Manolo com alguma ironia.


Com efeito, parece que o tal do Honório tinha cumprido todas as formalidades, como compensação ambiental para uma faixa de terreno na abertura de uma estradinha rural com 2km, onde, desde sempre, já havia uma trilha carroçável, dentro de uma fazenda. A estrada atrasou 5 anos por causa disso, o Honório e o empreiteiro ficaram sem receber esse tempo todo, etc. e tal, mas como tudo havia sido bem feito, quando um fiscal passou por lá, ele apresentou o documento de aceitação e todos acreditaram.


Afinal tinham criado áreas de preservação permanente, plantado 3 árvores por cada uma retirada, e até haviam sido soltos(as) na natureza 6 (seis) cobras, 10 (dez) tatús, 10 (dez) gambás e 20 (vinte) siriemas, tudo certificado por veterinário,. Metade machos, metade fêmeas, que era para procriarem. O curioso é que siriemas comem cobras e os gambás também comem cobras e ovos de siriemas, e ninguém teorizou esse aspecto. E as cobras hermafroditas? Como ficam nessa legislação preconceituosa?

Eu, que até ali, naquela conversa, nunca tinha ouvido falar em cobra certificada, fiquei pasmo. Talvez houvesse aí um problema de gênero e ninguém atinou disse, com sarcasmo e preconceito, o Edálio, outro colega ali presente aludindo à metade de cada gênero da arca de Noé dos dias de hoje.


Ninguém desconfiou de nada porque tudo havia sido cumprido. Todos os envolvidos receberam seus pagamentos, já fazia 5 anos que o assunto morrera, para o bem de todos e felicidade geral da nação. Portanto não havia crime. Se crime houvesse, seria o da demora pelo órgão ambiental em soltar o tal documento de ”conformidade”.


Dizia o Manolo: _ se a carteira de um motorista é falsa mas ninguém foi atropelado, você não pode condenar o motorista por um atropelamento que não houve, no máximo multá-lo por estar com uma carteira falsa. E se a emissão da carteira está atrasada embora as provas tenham sido todas feitas e o aluno aprovado?  A liberação da carteira demorou tanto que levou o motorista a, em desespero, “falsificar” uma. Uma carta de alforria falsa seria um crime?


Mas, se estava tudo perfeito, como surgiu a denúncia?


_ O Honório separou-se da mulher e ela, de sacanagem, denunciou o episódio no processo de separação.


Acho que a posição do Manolo está muito moderada, o Honório devia ganhar uma medalha do CREA e os colegas que o querem punir hão de ir para o inferno pra ver o que é bom para a tosse.   Por algum motivo, me veio à mente a letra e a música do Raul Seixas para fundo musical desta crônica que, por incrível que pareça, tem muuuito pouco de ficção. 













Miguel Fernández, engenheiro e cronista Rb     

3.500 toques, jan2024

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