emigrante : aquele que sai de sua região natal, por livre vontade, para viver em outro(s) lugar(es), sem perspectivas de retorno a curto prazo. Aquele que se foi para não voltar.
imigrante : aquele que chega de outros lugares, por livre vontade, para viver aqui, sem perspectivas de voltar ao seu lugar de origem ao menos a curto prazo. Aquele que veio para ficar.
migrante : aquele que sai de sua região natal por livre vontade ou chega a outra região sem intenção ou vontade de que seja para sempre. Ou porque quer voltar para onde veio ou porque faz algum trabalho temporário. Não confundir com os nômades que, embora não tenham um local fixo, vivem em uma região fixa)
Era por volta de 2005, em New Jersey, USA, o engº Leonard Goldblatt (LG, americano que vivera 15 anos no Brasil, onde nos conhecemos), me contava que, fazia uns 5 anos, ouviu um pessoal falando “brasileiro” na rua, puxou conversa e eram parte de uma turma trabalhando por lá, alguns legalmente, mas a maioria, ilegalmente. Acabou se aproximando de alguns, o que o levou a conhecer um pouco da intimidade deles e, de certa forma, o que viu e ouviu, o fez pensar como conhecemos pouco o mundo, apesar de ouvirmos as histórias:
LG: _ muitas moças e rapazes vem pra cá com a ilusão de que aqui é melhor e se submetem a um regime de vida e de trabalho inacreditável. Pra começar, dividem pequenos apartamentos entre muitos, para economizar, colocam camas-beliche, trabalham turnos de até 12 horas,. Acho que, se forem todos dormir ao mesmo tempo, não vão caber nos quartos. Não tem sábado, nem domingo, nem feriado, quase não saem para nada, é só trabalho e economia, juntar dinheiro e poder voltar para sua terrinha e dizer que venceu na vida, comprar uma casinha, montar um negócio. E contar o que quiserem sobre como foi, pois ninguém vai conferir mesmo... Quando se pergunta “de onde você é”, meio por piada, meio porque muitas vezes o imigrante está com vergonha do que está fazendo, desconversa, dizendo que é de Governador Valadares MG, que leva a fama.
LG_ _ porque não fazem isso no próprio Brasil, seu próprio país? Trabalhando 12 horas por dia, sem feriados e domingos, não gastando, só capitalizando, Com esse esforço, essa “entrega”, vai dar certo em qualquer lugar. E seria mais fácil.
A dificuldade, é fazer esses sacrifícios na frente dos conhecidos. A vaidade, as aparências, não deixam.
Na verdade, conhecemos as histórias dos que deram certo. E os que morreram? Os que suicidaram? Os que enlouquecem. Os fracassados que desaparecem na mendicância, no lumpen, somem nos cortiços das favelas. Conheci uma pessoa do consulado espanhol do Rio (alô Casas), entre outras casas encarregada da assistência social, que cobria os estados do ES, de MG e do RJ. Velejamos juntos, muita conversa. Ouvi cada história... De fazer chorar! A maioria das vezes eram terceiros que procuravam o consulado para contar que souberam de algum emigrante espanhol na miséria e o consulado ia lá tentar localizar a pessoa para repatriá-la. A pessoa mesmo não se apresenta, fica adiando, com vergonha.
De 1850 para cá, com a revolução industrial, o capitalismo, e a evolução dos costumes e das leis, me parece que já são menos os que saem de seu rincão por aventura ou por liberdade. Emigram por necessidade, seja fome, seja perseguições religiosas ou políticas, seja por motivos de desajuste social, familiar, psicológico ou pessoal.
São, todos, pessoas, como qualquer um de nós ou de nossos antepasados. E pessoas devem ser respeitadas.
Olhe no mapa onde fica o município de Borba, no Amazonas (AM). Até hoje não tem acesso por terra. Por ar, só de helicóptero. São, em média, 24horas de barco desde Manaus pelo rio Madeira. Alguém saberá dizer como, porquê, e para quê umas famílias que conheço, originárias do hoje Líbano, fronteira com a Síria foram parar por lá no início do século XX, antes da 1ª guerra mundial, por volta de 1905? Os descendentes se fazem essas mesmas perguntas, sem encontrar respostas. Provavelmente não contavam a verdade, fantasiavam, como a maioria.
Já na década de 50, pós guerra, muitos conterrâneos de meus pais e muitos nordestinos, apareceram por aqui, todos chegando cheios de esperança. Era vencer ou vencer. Uns achavam que era só uma questão de tempo, outros se jogavam de cabeça no trabalho. Uns venceram, outros não. Tiro o chapéu e reverencio os que tentaram e os que tentam.
Dentro deste assunto, digno de nota é o caso da hoje brasileira, ex-apátrida Maha Mamo, que por ser filha de pai cristão e mãe muçulmana, ambos sírios, onde o casamento inter-religioso é ilegal, ou não é aceito, o que dá no mesmo, foram morar no Líbano. Como o Líbano só dá nacionalidade por descendência (se fizerem isso com os libaneses, eles vão reclamar), resultou que os 3 filhos ficaram apátridas, ou seja, legalmente não existiam, não podiam ter documentos de identidade. Não tinham passaporte, não podiam se matricular em escolas e por aí adiante. Só de pensar que essas coisas ainda existem em mais da metade do mundo, me faz ver a infantilidade da maioria das pessoas. Ou o cinismo. Vale a pena ver o depoimento dela (Maha). I Belong - pelo fim da apatridia no mundo | Maha Mamo | TEDxSaoPauloSalon - YouTube I Belong - pelo fim da apatridia no mundo | Maha Mamo | TEDxSaoPauloSalon - YouTube ( https://www.youtube.com/watch?v=MbL6f3AVYfM )
No meio dessa miséria, alguns migrantes são privilegiados: Os que têm empregos ditos internacionais, agências de estado, multinacionais, esportistas, artistas. Esses costumam ser temporários nos lugares onde estão. São cheios de idéias liberais, mas no fundo são preconceituosos, até porque, muitos vivem desses problemas, como os elegantes funcionários dos organismos internacionais.
Existem ainda os que, pelas mais diversas desculpas, mudam de ambiente porque podem se “bancar” no estrangeiro. Alguns, poucos, por aposentadoria, e busca de novos ares. Outros por esnobismo ou luxo cultural, com alguém bancando ou queimando heranças. Acredito que sejam poucos embora caros. No fundo são apátridas por opção.
Mas há sempre os idiotas, aqui ou ali, a hostilizar estrangeiros com dificuldades. Se esquecem que não somos daqui, estamos aqui.
Miguel Fernández y Fernández, engenheiro e cronista, escrito em 2023 / 2924), 6,208 toques (com espaços)
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