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Foto do escritorMiguel Fernández

Laura

Atualizado: 22 de set. de 2023

Alguém já advertiu que o melhor parceiro(a) é o(a) que conhecemos de relance, isso porque não tivemos tempo de reparar nos defeitos. Imagine então uma pessoa que você só conhece porque outros te contaram. Essa pessoa é perfeita, você nem a viu, nem vai ver, só pode idealiza-la. Logo, é a pessoa ideal.


Como as Lauras.


Laura não é um nome corriqueiro, tampouco é um nome incomum. Então, sempre que aparecia uma Laura, nos lembrávamos do assunto.


Tudo porque, em 1961, no terceiro ano ginasial do Colégio de Aplicação, 5 colegas trocamos de colégio e fomos parar na mesma sala de aula, na mesma turma, onde, entre outros 5 que haviam saído, havia uma Laura, que nunca chegamos a conhecer, mas que era tida como uma menina linda, encantadora, com todos os predicados, e por quem, pelo menos dois dos alunos remanescentes estariam apaixonados, o Milazzo e o Moacir. E olha que a turminha tinha muitas meninas show.


Paixões com 15 anos são um problema sério pois, normalmente, é comum o outro nem perceber ou fingir não perceber. Neste caso então que a pessoa desaparece, vira personagem de ficção, o que fazer? Aprender a viver com as frustrações sem se frustrar, diriam os otimistas-realistas, não dados a se deprimir.


Então, a turma remanescente (como adolescentes são maus) ficava incitando, provocando os sentimentos do Milton e do Moacir, dizendo que ela tinha sido vista conversando com um rapaz, que a tinham encontrado numa festinha, que ela estava cada vez mais bonita, etc e tal. que estava numa nova escola no Largo do Machado. E lá iam, em devaneios, a procura-la, a segui-la, como o Milazzo foi visto pelo Sérgio, que me contou, fazendo hora na porta da tal escola, na saída do turno.


O fato é que passamos a avaliar as demais mulheres, que íamos conhecendo com o passar dos anos, com esse padrão inalcançável da Laura. Passou a ser parâmetro do ideal, do inatingível. Como se diz hoje, virou um “meme”. Uma vez, o Ademar foi visto com uma namorada linda, e logo alguém comentou perguntando: _ melhor que a Laura? E onde andará a tal Laura?


Tornou-se um problema para nossas vidas. Sempre que conhecíamos alguém, ficava a pergunta, como fica em relação à Laura? E se a Laura aparecer por aí? Mas a Laura era inalcançável: bonita, elegante, simpática, inteligente, culta, proativa, preguiçosa, rica, prendada, carinhosa, ágil, lânguida, forte, frágil, loira e morena, alta e baixa, magra e fofa.


Até quando algum filho ou neto aparecia com uma parceira, ficávamos pensando: será melhor que a Laura? E para nossas então colegas, quem seria o Lauro? E o Milazzo? Que fim levou? Teriam “ficado”? Teriam namorado? Não teriam? Terão se reencontrado? Estarão casados? Entre si? Filhos? Nunca mais se viram? É do que trata Kundera em seu excelente (a insustentável leveza do ser”. Somos todos assim, Lauras, Milazzos, Moacirs. Que ruim! E que bom!


Lembrei disso porque, recentemente, entrei em uma reunião profissional e havia uma Laura que, aparentemente, reunia todos os requisitos para ser uma filha, ou até neta da Laura. Quase perguntei o nome da mãe e da avó, e onde teriam estudado. Mas me contive. Até porque, só conheci de relance.


Miguel Fernández y Fernández, Engenheiro e cronista,

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1 Comment


Glória Mota
Glória Mota
Sep 13, 2023

MUITO BOM, COMO SEMPRE. BJS.

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