A “falecida” Montreal Engenharia (1955 – 2005, 100% brasileira chegando a ter 25.000 empregados), foi uma verdadeira escola de pós-graduação para engenheiros, arquitetos, economistas, advogados e amizades (e algumas raras inimizades também porque seria mentira sustentar o contrario em qualquer ambiente).
Em 1977-78 a Divisão de Projetos da Montreal (MONEP) veio a incorporar a Internacional de Engenharia (IECo, divisão da Morrison-Knudsen, dos EUA), embora a IECo fosse maior que a MONEP. Passou a se chamar IESA.
No departamento de arquitetura, só feras, comandadas pelo Gilberto Ribeiro: o Ascânio, o Milton, o Eric, o Luís, o PPaulino, o Emidio, o Kleris, o Artêncio, a Teresa, a Ângela, enfim, em arquitetura industrial eram inigualáveis em qualquer lugar do mundo.
O Emidio era um caso à parte. Excelente arquiteto e privilegiado desenhista “a mão livre”, conseguia fazer rapidamente, excelentes desenhos em perspectiva, verdadeiros quadros, mostrando como iria ficar a unidade em desenvolvimento, em alto nível de detalhes e perfeição, ao mesmo tempo em que ia resolvendo questões do projeto e incorporando soluções. Não que os outros também não fizessem, todos eram bons em traçar as perspectivas necessárias desde o início dos trabalhos, conforme iam ditando a imaginação, as necessidades técnicas e o bom gosto.
O “toque” era o perfeccionismo do Emidio. Fazia os desenhos para nossas reuniões internas, e discussões, mas depois recolhia tudo e não deixava mostrar ao cliente porque sempre precisava melhorar algo.
Por volta de 1998-2000, muitos de nós já haviamos deixado a IESA. Eu estava na AQUACON fazendo um trabalho para a iniciante Prolagos e convidei o Emidio para trabalhar conosco, especificamente na Estação de Tratamento de Água Juturnaiba 1 (antiga ETA C. N. Álcalis), que ia ser reabilitada e duplicada.
O Emidio entendeu tudo, os aspectos hidráulicos, químicos, estruturais, de fundações, tubulações, bombas, filtros, e desenhou um “vol-de-oiseau” de como ficaria a ETA, a lápis sobre papel, como se fosse um “bico-de-pena”, com as expansões, reformas, etc. Como sempre, ficou “bom e bonito”, ou seja, ótimo.
Dias depois haveria uma reunião em Cabo Frio com o presidente da Prolagos, à época o Vlamir Paes. Mandamos fazer uma cópia-ampliação caprichada do desenho do Emidio e fui para a reunião. Por respeito aos direitos autorais e para dar a César o que é de César, antes de mandar para a cópi, acrescentei, a lápis, e imitando letra de arquiteto a data e o nome do Emidio no canto inferior direito, como os pintores costumam fazer nos quadros. Chegando lá, o desenho foi um sucesso e o Wlamir se apossou dele.
Passado um mês fomos, em caravana, com uns portugueses e uns alemães (da Hochtief) e o Emidio, percorrer a região de concessão da Prolagos, terminando com uma reunião na sala ao lado da do “presidente”. Em determinado momento fui à sala do Vlamir e vi que o desenho, mais ou menos em formato A2, tinha virado um quadro, com moldura e tudo, na parede, atrás da cadeira dele. Achei ótimo, o cliente estava gostando do nosso trabalho sob todos os aspectos. Fui chamar o Emidio para ver, achando que ficaria feliz.
“Pra quê......!?!?!”
O Emidio “soltou a franga” como disse o Ray Coniff em apresentação de sua orquestra no Canecão-Rio naquela mesma época: >> que não podíamos ter divulgado aquilo sem autorização dele, >> que faltava terminar o desenho, >> que não estava bom, >> que ele fizera de qualquer forma para “estudo”, >> para ser exposto teria que ser refeito, >> que era um desrespeito, etc, etc.
Quando parecia que estava se acalmando, viu a tal “assinatura falsificada”!
Voltou tudo à estaca zero, abstraiu que não estava só, e com toda a educação de um arquiteto em transe passou a vociferar contra o quadro e contra todos, especialmente a minha pessoa, acusado de “falsificador barato”, “adulterador”, “inventor de arte”, “sem conhecimento”, “imbecil no assunto”, “idiota perfeito e perfeito idiota”, enfim, sobrou até para a senhora minha mãe.
Salvaram-me os Eng°s J. Casasola, e M. Carvela, então na Prolagos, que intervieram, incrédulos, meio rindo meio a sério e, com a elegância que lhes é peculiar, arrastaram o Emidio para outro andar diante dos olhares surpresos de alemães e portugueses que não entenderam nada.
O incidente acabou superado, porque éramos todos do bem (vascaínos), aí incluídos o querido Emidio, o Casasola, o Vlamir, e até o Olavo Monteiro de Carvalho, acionista majoritário da Prolagos na época.
Miguel Fernández y Fernández,
engenheiro consultor e cronista, fev2022
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Un hermoso recordatorio, me gustó mucho eso de amistades y enemistades. Así es la realidad de la vida, las amistades son las q construyen