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  • Foto do escritorMiguel Fernández

O Telex do Banco Central

Atualizado: 29 de jun. de 2023

Em 1967 o Rio de Janeiro ainda era, de fato, a capital do Brasil, embora de direito Brasília já o fosse desde 1960. A federação estava se reestruturando e havia recém-criado o BC - Banco Central do Brasil em substituição à até então SUMOC - Superintendência da Moeda e do Crédito (que englobava a Casa da Moeda).


A primeira sede do BC foi o prédio da Av. Pres. Vargas 84, na esquina norte com a rua 1º de Março, no centro do Rio (Candelária), onde, entre outras, se instalou a DIMAP, Divisão de Material e Patrimônio (burocrata adora siglas). Essa DIMAP era importante pois precisava implantar, desde as máquinas para cunhar moedas e imprimir notas, passando pelas chapas para fazer as moedas, o papel e as tintas especiais, os impressos do dia-a-dia, as cadeiras e mesas, as lâmpadas, os aparelhos de ar condicionados, os ventiladores, as máquinas de escrever, os carros (burocratas adoram um luxo e se acham uma casta à parte), sabonete e papel higiênico, aquisição e reformas de prédios, enfim, tudo.


Mas não era só, a DIMAP também cuidava do pessoal terceirizado, contratado para a limpeza, os serviços gerais (cafezinho, mensageiros e motoristas) e cuidar da segurança com vigilantes armados e não armados, para os prédios, para a guarda e o transporte de dinheiro vivo e para guarda-costas de diretores, sem o que não se sentiam poderosos.


Foi nessa época que começaram a aparecer as máquinas de escrever e de calcular elétricas, os aparelhos de fax, as comunicações por ondas, por antenas e por satélites, até então domínio exclusivo dos fios, tiveram uma grande evolução, ou seja, os avanços na eletrônica começavam a dominar as transmissões de dados e correspondências, até então domínio dos fios de telégrafo e dos correios físicos (as cartas).


O recrutamento e treinamento de pessoal que já era um problema em si pela grandeza da coisa, passou a ser um problema maior pelas novidades quase diárias aportadas pelas IBMs, pelas Burroughs, pelas Olivettis, as Remingtons, as Panassonics (japoneses chegando), as FACIT, as Siemens e outras que não me lembro).


Mas a chegada dos TELEX marcou época. Era uma máquina de escrever elétrica comandada à distância, com uma fitinha perfurada que gravava tudo e podia escrever tudo de novo. Rápidamente separaram a impressora do teclado e o papel podia ser uma tira de 100m, chamado formulário contínuo, picotado onde se cortavam as páginas. Ou folha por folha. Até desenhos A3 era possível fazer usando programação e analogias. O Presidente estava em Brasilia e sua carta ou ata de reunião era impressa em qualquer lugar do mundo onde houvesse uma máquina similar (com o mesmo código operacional). No início uma IBM só falava com uma IBM e por aí ia, mas rapidamente alguém botou ordem no barraco e padronizaram.


Como as máquinas eram caras, criaram as salas de telex, onde se concentravam transmissões e recebimentos, otimizando o uso do equipamento disponível. Essas salas eram praticamente aquários envidraçados exibidos aos visitantes como estado-da-arte em tecnologia e importância, onde se trabalhava em verdadeiro frenesi, porque até o que não precisava passar por lá, passou a passar, já que os chefinhos de qualquer coisa achavam que dava prestigio. Nesse prédio da Av. Pres. Vargas 84, um ”aquário de telex” foi montado no térreo, ao fundo do hall dos elevadores, para que todos vissem.


O prédio fechava diariamente às 22hs e. por motivos de segurança só abria no dia seguinte às 06 horas quando o turno da vigilância armada rendia o anterior. Nos fins de semana havia um rodízio a cada oito horas. Essa rotina seguia sem percalços, até que, numa segunda feira, às 6 horas da manhã o plantão que estava dentro não apareceu para ser rendido pela equipe do turno que chegava. Foram chamados os bombeiros, a polícia, ambulâncias, etc. para arrombar a porta e ver o que tinha havido com os dois seguranças que haviam feito o turno do domingo para a segunda. Eram dois funcionários, um recém-contratado e outro mais experiente. O que teria havido? Quando o prédio foi invadido pela equipe de resgate, notou-se que tinha havido um tiroteio na sala do telex do térreo, com os vidros do “aquário” destruídos e balas incrustadas por todo lado. A “tomada” do prédio foi cinematográfica, andar-por-andar, até o último andar, a presidência.


Felizmente os dois “vigilantes-seguranças” estavam ali, vivos e sem ferimentos, trancados na sala do presidente, apavorados, sem saber o que fazer. Coube ao Diniz e ao Benoliel, da DIMAP conduzir o inquérito.


Parece que após a troca de guarda, o vigilante mais velho resolveu tirar uma soneca lá prá cima. O vigilante mais jovem, recém-chegado de Feira de Santana, com diversos cursos de tiro e de hierarquias, além de muitas crenças no além, ouviu alguém datilografando e foi averiguar quem teria ficado escondido, provavelmente para fazer algum serviço particular, trabalhando à meia noite naquele silêncio, achando que ninguém ia notar. Vendo as teclas se moverem sem ninguém, concluiu que era um fantasma (os telex da Olivettti realmente davam essa impressão) e, não teve dúvidas, descarregou toda a munição que tinha até o telex parar e foi acordar o companheiro. Quando concluíram o que tinha acontecido, ficaram com vergonha de se apresentar ao público.


A empresa de segurança foi descredenciada por RH inadequado na seleção e no treinamento. A DIMAP teve que comprar outros quatro telex. Vida que segue.



Miguel Fernández y Fernández, engenheiro e cronista

2013_2023jun25, 5.330 toques

Nota para registro: eu trabalhei na DIMAP do BC de meados de 66 a meados de 1969 como funcionário público concursado. Pedi demissão para ser estagiário de engenharia na MontrealEngenharia.


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